3 de set. de 2015

Resumo do livro "Bruno: Psicomotricidade e Terapia"

AUCOUTURIER, Bernard & LAPIERRE, André. Bruno: Psicomotricidade e Terapia. Tradução: Alceu Edir Fillman. Rio de Janeiro: Ed. Artes Médicas 1986.


PRÓLOGO. Lapierre vai enfatizar a existência de um núcleo psicoafetivo “enterrado nas profundezas do inconsciente” que está muito ligado às experiências corporais, “às modulações tônicas da vivência do corpo, à carga afetiva induzida pelo movimento e à situação do corpo em relação com o outro ou com o objeto.” (p. 14). É neste nível que serão feitas as intervenções terapêuticas com Bruno. O terapeuta se engaja com a criança em um diálogo infraverbal.

Autenticidade, disponibilidade e empatia, noções fundamentais da psicologia rogeriana são também importantes na abordagem psicomotora, pois sublinham a importância atribuída a pessoa. 

CAPÍTULO 1 – O passado de Bruno. Bruno não fala e a construção da sua história foi feita através das falas dos pais. A mãe teve uma gravidez conturbada e o nascimento de Bruno foi traumático, utilizando fórceps, machucando profundamente na têmpora direita. O pai não encontrou reflexos arcaicos, apenas a sucção. Percebe-se então um retardo no seu desenvolvimento. Bruno não demonstra interesse por objetos, mas, embora seja bloqueado no “agir” demonstra muito interesse na ação dos outros. Parece não ter muito contato com a mãe que devido a problemas de saúde achava bom que fosse quietinho. A família investe em reeducações. Aos 3 anos têm dificuldade de se inserir socialmente, devido a turbulências psicoafetivas que estão relacionadas. Bruno passou pelo maternal, estabelecimentos especializados, reeducações até chegar a terapia psicomotora aos 7 anos.

CAPÍTULO 2 – Primeiro contato e observação. No primeiro contato Bruno está apenas com um calção de banho e mostra movimentos incoordenados. Sua marcha é pesada e apresenta tensões tônicas mal coordenadas. Não apresenta o balanço normal dos braços e em caso de mudança emocional apresenta um movimento de braços como um “batimento de asas”, em movimentos convulsivos de torção de braço. 

Bruno não se interessa pelos objetos e seu sintoma predominante é a ausência de linguagem, ele apenas emite gritos inarticulados, sem organização fonética alguma.

Os terapeutas não tentariam uma reeducação, pois além de já ter sido tentada, ela “dirige-se apenas ao nível dos comportamentos, sem modificar as estruturas profundas da personalidade que se encontram por debaixo destes.” (p. 26) e cria um conflito com a criança que defende seus sintomas.

Vendo o que havia de positivo no comportamento de Bruno, Bernard adota a posição quadrúpede, oferece seu corpo para um contato corporal mais próximo e com os gritos análogos ao de Bruno é que se estabelecem uma primeira comunicação. Os princípios que regem este trabalho são 1. Imitação: segundo observação dos autores e pesquisas, quando uma criança de dois anos quer estabelecer comunicação com outra, ela começa a imitá-la. 2. Evolução psicogenética da comunicação: Considerando a linguagem verbal o modo mais evoluído de comunicação e necessita de uma passagem prévia nos níveis de comunicação mais primitivos. Os níveis são: 1. Contatos corporais e, sobretudo trocas tônicas e "cargas tônicas" com a mãe ou seu substituto; 2. Tomada de distância através do "objeto transicional"; 3. Trocas através de sons vocais (o grito); 4. Trocas através da mediação de objetos; 5. Trocas através de sons instrumentais (intermediários: objetos sonoros, gestos sonoros); 6. Trocas gráficas (intermediários: o som ligado ao grafismo); 7. Estruturação da linguagem.

Os autores acrescentam que o essencial ao longo destes diversos modos de comunicação, é a carga afetiva que se encontra por baixo deles.

CAPÍTULO 3 – Terapia psicomotora. Neste capítulo há a descrição do primeiro ano da terapia que durou 3 anos. A descrição segue os níveis de comunicação citados no capítulo anterior.

Bernard está apenas de calção e Bruno está de cuecas. Bruno se desloca livremente pela sala, e Bernard apenas o observa, pois se proibiu de falar. Bernard começa a se deslocar lentamente na posição de quatro pés depois se imobiliza no centro da sala como um convite a iniciativa exploratória de Bruno. Bruno inicia um contato pelas costas para evitar o contato face a face. Ele situa seu corpo segundo o eixo corporal do outro. “Esta situação prossegue quando Bruno engaja todo seu corpo no contato, alongando-se sobre o dorso de Bernard, em um contato muito estreito.” (p. 32). Bruno buscará o contato das mãos e da boca nas costas de Bernard e assim começará a se interessar pelo rosto.

Após as primeiras sessões, Bernard tenta afastar Bruno de seu corpo, propondo tapetes de diversas cores, macios ao contato, porem este volta a solicitar o contato com o corpo, pois ainda não esgotou o prazer e o desejo desse contato primitivo que ele reencontrou. “Serão necessárias etapas intermediárias antes que seja capaz de transferir sua carga afetiva aos objetos.” (p. 33). Bruno agora consegue iniciar e romper o contato, jogando com o seu desejo.

Diálogos de gritos aparecem como contato. Há a introdução do objeto para desviar uma parte da afetividade da criança. O objeto intercalado no contato direto é um mediador de contato. Bruno reproduz movimentos de Bernard com o objeto carregado de afetividade (objeto transicional).

São propostas cordas de algodão, que mediam as primeiras trocas e a primeira comunicação. Depois de um tempo Bruno brinca sozinho com as bolas murchas, adquirindo um pouco de autonomia. Aparece então um objeto sonoro, a bola de ping-pong, cujo barulho agrada Bruno que se interessa também por outros sons: pega uma baqueta e bate nos címbalos. Bernard então aparece com um tambor e começa a bater com uma baqueta. Neste momento Bruno pronuncia a palavra “TAMBOR” sem ela ter sido pronunciada em nenhum momento na terapia, mostrado que a linguagem estava nele, embora ele não dispunha dela. Com a terapia psicomotora e o reestabelecimento da corrente afetiva que inicia a comunicação de base, tornou possível o aparecimento da linguagem verbal. Bernard adota uma atitude neutra e se contenta a apenas pronunciar a palavra de Bruno, utilizando a imitação.

Para mediar mais a comunicação surge um objeto fixo, um quadro sonoro em madeira que permitirá associar o som ao traço gráfico deixado pelo gesto. Bernard utiliza de esponja para apagar o traçado de Bruno e o oferece a esponja para que ele faça o mesmo, mas ele não consegue. Bruno tem uma fase de regressão. Bruno morde o terapeuta reencontrando sua agressividade, assim se acalma, após tendo um diálogo tônico com Bernard. Bruno expressa seu ser-no-mundo e possibilidade de existir na situação da esponja úmida.

São introduzidos objetos duros, frios, assinalando uma tomada de distância afetiva assim, com a ideia de estabelecer uma relação de utilização construtiva. O paciente quando olha e sorri neste momento busca uma cumplicidade tática com Bernard. Quando Bruno descobre a cooperação, passou pela atividade destrutiva espontânea para uma atividade construtiva refletida, que constitui um passo para a socialização.

Bernard agora propõe tinta vermelha e azul e papel. Bruno tem medo da tinta, e isto pode estar relacionado com sua dificuldade com seus excrementos (retenção). Através do contato Bruno consegue sujar seu dedo na tinta que esta em Bernard, acontecendo uma troca simbólica. Com o tempo ele passou a molhar o dedo na própria tinta e pronunciar “tinta”, “azul”, “vermelho”, etc.

CAPÍTULO 4 – Evolução Posterior. Bruno ficou 3 anos em terapia e quando tinha dez anos e meio o seus pais optaram por coloca-lo em um semi-internato numa cidade vizinha. O equilíbrio de Bruno melhorou, podendo mantê-lo em superfícies pequenas com pouca ajuda. Houve progressão em sua motricidade fina, controle maior dos gritos, sendo que sua compreensão da linguagem melhorou muito estruturando frases que expressão desejo de ação, como por exemplo, “ eu quero tomar água”. Assim com o aparecimento do pronome “eu” assina-la a ligação de sua identidade com seu eu corporal. “Ao chegar em sua classe, ignorava completamente os outros, não tinha consciência alguma do grupo; agora nomeia e identifica todos os seus colegas e os abraça.” (p. 74). Ele teve grandes melhoras, consegue receber ordens, fica sentado e é mais sociável.

Os autores falam que talvez se Bruno iniciasse o tratamento mais cedo, ele teria mais melhoras e criticaram a terapia de reeducação pois ela “não atingirá, pois, sua eficácia máxima, se não colocar em jogo todo o conjunto do aparelho neurológico, incluindo-se aí os centros motores, de integração emocional e de regulação tônica.” E propõe a terapia psicomotora, como essa possibilidade de integração.

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